segunda-feira, 11 de abril de 2016

XCO Internacional





















A descida é tão íngreme que, a princípio, assusta só de ver. Custa a crer que possa ser feita a grande velocidade e sem arranhões. Mas a prova não tarda: pouco antes das três da tarde, dezenas de ciclistas precipitam-se sobre a encosta a um ritmo estonteante (alguns chegam aos 60 quilómetros/hora) e prosseguem a marcha como se nada fosse.
"Descem isto como eu bebo um copo de água". A comparação é de Rogério Vaqueiro, colaborador da organização da XCO Internacional de Valongo, que decorreu neste domingo. É ele que acompanha o JN ao longo dos mais de 90 minutos de corrida, numa espécie de visita guiada aos pontos mais emotivos de um circuito de quatro quilómetros. Vezes seis, o número de voltas.
"O grande atrativo do XCO é a natureza. Estas provas são feitas no meio do monte. E como é um circuito, têm mais emotividade. Depois, oferecem vários obstáculos, várias formas de correr, várias técnicas e táticas. É um desporto que requer muita perspicácia", explica Manuel Pinto, presidente da Associação de Ciclismo do Porto.
Para os menos entendidos, explique-se: XCO é outra designação para cross-country olímpico, a única disciplina da BTT que, como o próprio nome indica, está representada nos Jogos. E a corrida de Sobrado é importante nessa luta. Afinal, trata-se de uma prova C1, categoria máxima.
Por isso, a vila de Valongo reuniu, durante o fim de semana (sábado foi dia de treinos), perto de 500 atletas - só na principal corrida masculina foram mais de 200, entre elite e sub-23. Com a "nata" da modalidade incluída, esclarece Rogério Vaqueiro.
Ao longo do trajeto, descidas e subidas a perder de vista, em que os esgares de sacrifício dos atletas tratam de desfazer qualquer hipótese de que isto, afinal, possa ser mais fácil do que parece.
E a inclinação inicial do percurso? "Costuma-se dizer que parecem motos". Percebe-se porquê quando vemos os atletas galgarem a encosta a grande velocidade. Só que, aqui, os únicos motores que têm são as pernas. Isso e os constantes incentivos das centenas de pessoas que se juntam a assistir.
"Vai Fábio", atira Rogério a um atleta da terra, assim que ele passa a zona do ribeiro. Sim, ainda há isso. As grandes poças de lama que lhes abrandam a marcha e salpicam tudo em redor. "Isto são mais 13 volts", diz, referindo-se ao incentivo que acabou de dar.
Fábio, Zé, David. Os nomes variam, mas o gesto é repetido por quase todos os que assistem à prova. E, para que o apoio aos atletas de eleição não falhe, há até quem leve sinetas e megafones.
Só que, ao contrário do que o empenho na corrida possa dar a entender, entre os ciclistas quase não há quem viva disto. Há-os advogados, serralheiros, até talhantes, mas profissionalização é uma palavra que mal tem lugar aqui.
David Rosa é uma das poucas exceções, ele que, há quatro anos, em Londres, se tornou no primeiro português a competir nuns Jogos Olímpicos, em BTT. Tem 22 anos, mas não parece. Tem a compleição física de um catraio. E isso é tudo menos mau. A teoria diz que, quanto mais leves, mais fácil se torna trepar a montanha.
Ele faz questão de o mostrar a cada subida, enquanto exibe as pernas negras de tanta lama. Mas, neste domingo, nem isso lhe permitiu ir além do segundo lugar, atrás de Mário Costa. Depois de uma primeira volta equilibrada, o atleta da ASC/Focus Team Vila do Conde descolou e nunca mais foi apanhado.
"Foi a segunda vitória mais importante da minha carreira, a seguir ao título nacional de elite (2012). É ver o trabalho de todo o inverno recompensado", conta o vencedor, ao JN, minutos depois de cruzar a meta, sem esconder que o grande objetivo é chegar os Jogos Olímpicos deste ano.
Neste momento, uma parte da missão está bem encaminhada. Com os 130 pontos conquistados ontem, graças a um pódio inteiramente nacional, Portugal consolidou o 10.º lugar do ranking internacional e está portanto bem colocado para apurar dois atletas para o Rio. Depois, caberá ao selecionador decidir quem serão os felizardos.
Voltando ao herói do dia. "E então, recuperado?", perguntamos-lhe. "Ui, não. Isto agora só lá para quarta-feira", garante Mário, entre risos. Mas já diz o ditado: quem corre por gosto...
Texto por Ana Tulha

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